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ACÓRDÃO Nº 00054/2020 PROCESSO Nº 0461632016-0

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

Processo nº 0461632016-0
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:TINTAS LUX LTDA EPP
Recorrida:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
Preparadora:CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR3 DA SEFAZ–CAMPINA GRANDE
Autuante:TIBÉRIO TEIXEIRA DE OLIVEIRA
Relator:CONS.ºSIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA.

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO - DENÚNCIA CARACTERIZADA EM PARTE – AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA - RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.

- A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios configura a ocorrência de compras efetuadas com receita de origem não comprovada, em face da presunção legal de que trata o artigo 646 do RICMS/PB. In casu, o contribuinte apresentou elementos que evidenciaram a insubsistência parcial da acusação, fazendo sucumbir parte do crédito tributário originalmente lançado. Ajuste realizado.
- Não há que se falar em arbitramento de base de cálculo quando os documentos que embasaram a denúncia se constituem elementos dotados de validade jurídica.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o voto do relator  pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a decisão monocrática e julgar parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000426/2016-76, lavrado em 14 de abril de 2016 contra a empresa TINTAS LUX LTDA EPP, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 440.707,52 (quatrocentos e quarenta mil, setecentos e sete reais e cinquenta e dois centavos), sendo R$ 200.353,76 (duzentos mil, trezentos e cinquenta e três reais e setenta e seis centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I; 160, I c/c 646, todos do RICMS/PB e R$ 200.353,76 (duzentos mil, trezentos e cinquenta e três reais e setenta e seis centavos) de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancela, por indevido, o montante de R$ 145.936,84 (cento e quarenta e cinco mil, novecentos e trinta e seis reais e oitenta e quatro centavos), sendo R$ 72.968,42 (setenta e dois mil, novecentos e sessenta e oito reais e quarenta e dois centavos) de ICMS e R$ 72.968,42 (setenta e dois mil, novecentos e sessenta e oito reais e quarenta e dois centavos) de multa por infração.

 

P.R.I

Segunda Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em  18 de fevereiro de 2020

                                                                                    SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
                                                                                                     Conselheiro Relator

 
                                                                                 GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
                                                                                                             Presidente


Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara de Julgamento, MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES, DAYSE ANNYEDJA GONÇALVES CHAVES e PETRONIO RODRIGUES LIMA.

                                                                                        RACHEL LUCENA TRINDADE
                                                                                                 Assessora Jurídica

#

RELATÓRIO

 

Em análise nesta Corte, o recurso voluntário interposto contra decisão monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000426/2016-76, lavrado em 14 de abril de 2016 em desfavor da empresa TINTAS LUX LTDA EPP, inscrição estadual nº 16.150.555-4.

Na referida peça acusatória, consta a seguinte denúncia, ipsis litteris:

 

0362 – FALTA DE LANÇAMENTO DE N. FISCAL DE AQUISIÇÃO. >> Aquisição de mercadorias consignadas em documentos fiscais, com receitas provenientes de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis e/ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido. (SIMPLES NACIONAL)

 

 

Nota Explicativa:

AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS CONSIGNADAS EM DOCUMENTOS FISCAIS, COM RECEITAS PROVENIENTES DE OMISSÕES DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS E/OU A REALIZAÇÃO DE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS TRIBUTÁVEIS SEM O PAGAMENTO DO IMPOSTO DEVIDO. (SIMPLES NACIONAL) REFERENTE AOS EXERCÍCIOS 2013/2014.

 

Em decorrência deste fato, o representante fazendário, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I e 160, I c/c o 646, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 546.644,36 (quinhentos e quarenta e seis mil, seiscentos e quarenta e quatro reais e trinta e seis centavos), sendo R$ 273.322,18 (duzentos e setenta e três mil, trezentos e vinte e dois reais e dezoito centavos) de ICMS e R$ 273.322,18 (duzentos e setenta e três mil, trezentos e vinte e dois reais e dezoito centavos) a título de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Embasando a denúncia, o auditor fiscal responsável pela autuação anexou à peça acusatória os seguintes documentos:

a)      Planilha denominada NOTAS FISCAIS NÃO REGISTRADAS NA EFD (fls. 5 a 10);

b)      Cópias dos DANFEs relativos às notas fiscais apontadas na planilha indicada no item anterior (fls. 11 a 195).

 

Depois de cientificada por via postal em 23 de abril de 2016 (fls. 200), a autuada, por intermédio de seu sócio administrador, apresentou, em 20 de maio de 2016, impugnação tempestiva contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 202 a 206), por meio da qual afirma, em síntese, que:

a)      Dentre as notas fiscais relacionadas pela auditoria, existem documentos: i) que foram registrados na EFD do contribuinte; ii) devidamente escriturados no Livro Diário;

b)      As notas fiscais indicadas pela fiscalização, que não estão relacionadas nos demonstrativos apresentados às fls. 203 a 206, de fato, não foram escrituradas pela autuada.

 

Com informação de existência de antecedentes fiscais (fls. 207), foram os autos conclusos (fls. 208) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais - GEJUP.

Em 20 de junho de 2016, pelo fato de haver o contribuinte praticado conduta reincidente, nos termos do artigo 39 da Lei nº 10.094/13, o auditor jurídico da GEJUP fez retornar o processo à repartição preparadora para que notificasse o autor do feito fiscal para aplicação da multa recidiva e, após realizado o procedimento, reabrisse o prazo para o contribuinte se manifestar acerca da majoração do crédito tributário, nos moldes do artigo 67 da Lei nº 10.094/13.

O auditor fiscal, em resposta à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, informou, às fls. 215, que a solicitação não poderia ser cumprida ante a impossibilidade técnica do Sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba, que não permite alterações de Auto de Infração já homologado.

Retornando os autos à instância prima, foram eles distribuídos ao julgador fiscal Rodrigo Antônio Alves Araújo, que decidiu pela procedência da exigência fiscal, nos termos da seguinte ementa, litteris:

 

FALTA DE REGISTROS NA EFD DE DOCUMENTOS FISCAIS DE AQUISIÇÃO.

É obrigação do contribuinte efetuar o registro das operações realizadas na Escrituração Fiscal Digital, cuja ausência dos respectivos registros repercute diretamente na presunção legal de omissão de saídas de mercadorias tributadas, ensejando na exigência do ICMS referente a omissão de venda pretérita. A ausência de provas materiais por parte da acusada que demonstrassem erro ou o efetivo registro no livro próprio teve o condão de ratificar a denúncia, a qual permanece incólume para efeito de exação.

AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE.

 

Cientificada da decisão proferida pela instância prima em 17 de agosto de 2018, a autuada, por intermédio de seus advogados (fls. 268), apresentou, em 18 de setembro de 2018, recurso voluntário tempestivo ao Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba (fls. 228 a 250), por meio do qual assevera que:

a)      A fiscalização adotou, como base de cálculo, os valores das notas fiscais não lançadas. Ocorre que a legislação não possui qualquer dispositivo que autorize tomar estes valores como base de cálculo do imposto. Por este motivo, o Auto de Infração é nulo;

b)      As hipóteses de arbitramento estão elencadas no artigo 23, incisos I, II, III e IV, da Lei nº 6.379/96;

c)      As presunções de omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis de que tratam os §§ 8º e 9º, do artigo 3º, da Lei nº 6.379/96, e reproduzidos pelo artigo 646 e seu parágrafo único do RICMS/PB, constituem situações de fundada suspeita de que os documentos e livros fiscais não refletem o valor real da operação ou da prestação, dando ensejo, obrigatoriamente, ao arbitramento da base de cálculo;

d)     O levantamento realizado pela fiscalização contém diversas notas fiscais que foram devidamente escrituradas na EFD do contribuinte, o que demonstra o equívoco da autoridade fiscal ao efetuar o lançamento;

e)      Uma vez que grande parte das notas fiscais autuadas se encontra escriturada na EFD, é evidente que, no que concerne aos referidos documentos, a acusação é absolutamente descabida;

f)       Foram relacionadas pela fiscalização diversas notas fiscais que foram registradas na escrituração contábil do contribuinte, o que afasta a presunção de omissão de saídas;

g)      Ainda que não acatados os argumentos anteriores, cumpre observar que as presunções de omissão de saídas não podem ser automaticamente estabelecidas, sem que se perquira, anteriormente, se houve a efetiva ocorrência de desembolsos em valores superiores às receitas oficiais do exercício, nos termos do parágrafo único do artigo 646 do RICMS/PB e do § 9º do artigo 3º da Lei nº 6.379/96. O “estouro de Caixa” é pressuposto essencial de todos os fatos presuntivos estabelecidos nas referidas normas;

h)      Os balanços patrimoniais dos exercícios de 2013 e 2014 atestam que a recorrente dispunha de recursos oficiais suficientes para fazer frente às despesas supostamente não contabilizadas.

 

Com base nas considerações acima, a recorrente requer:

a)      A nulidade do lançamento tributário, seja pela indevida base de cálculo utilizada, seja pelos graves equívocos evidenciados no levantamento fiscal;

b)      Caso assim não se entenda, seja reconhecida a improcedência da exigência fiscal;

c)      A regular intimação dos advogados constituídos para efeito de eventual realização de sustentação oral na sessão de julgamento.

 

Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.

Considerando o pedido de sustentação oral consignado pelo contribuinte às fls. 250, remetemos o processo à Assessoria Jurídica desta Casa, solicitando emissão de parecer técnico acerca da legalidade do lançamento, o qual foi juntado às fls. 410 a 415.

Em razão das informações apresentadas no recurso voluntário interposto pelo sujeito passivo e tendo em vista os princípios da oficialidade e da verdade material, baixamos os autos em diligência (fls. 416 e 417) ao Centro de Atendimento ao Cidadão da GR3 da SEFAZ – Campina Grande para que, na qualidade de repartição preparadora, os remetesse ao auditor fiscal responsável pela autuação para que ele se manifestasse acerca dos elementos trazidos à baila pela defesa, em especial quanto à existência de notas fiscais autuadas que estariam registradas na EFD e/ou nos livros contábeis da recorrente.

Em resposta à diligência requerida, o agente fazendário comparece aos autos para afirmar que:

a)      Constatou que as notas fiscais nº 103351 e 44921, emitidas em 24/7/2013 e 23/03/2014, respectivamente, encontram-se devidamente registradas;

b)      Os Livros Diário referentes aos exercícios de 2013 e 2014 foram autenticados em 18/5/2016, conforme atestam os Termos de Autenticação nº 16/002229-0 e 16/002228-2 (fls. 425 a 439).

 

Eis o relatório.

 

VOTO

 

A matéria em análise versa sobre a denúncia de aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto, irregularidade constatada pela fiscalização ao detectar a ausência de lançamento de diversas notas fiscais de aquisição nos livros próprios da empresa TINTAS LUX LTDA EPP, nos exercícios de 2013 e 2014 (vide planilha juntada às fls. 5 a 10).

Além de caracterizar descumprimento de obrigação acessória, a falta de escrituração de documentos fiscais de entradas pode ganhar contornos mais amplos. Isto porque a legislação tributária do Estado da Paraíba incluiu esta conduta no rol daquelas que autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o recolhimento do imposto devido.

Vejamos o que estabelecem os artigos 3º, § 8º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB[2], cujo teor reproduzo a seguir:

 

Art. 18. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de mercadorias, bens, serviços ou direitos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé às declarações ou os esclarecimentos prestados ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

Art. 23. Nos seguintes casos especiais o valor das operações ou das prestações poderá ser arbitrado pela autoridade fiscal, sem prejuízo das penalidades cabíveis, observado o disposto no art. 18:

I - não exibição, à fiscalização, dentro do prazo da intimação, dos elementos necessários à comprovação do valor real da operação ou da prestação, inclusive nos casos de perda ou extravio de livros ou documentos fiscais;

II - fundada suspeita de que os documentos e livros fiscais não refletem o valor real da operação ou da prestação;

III - declaração nos documentos fiscais, sem motivo justificado, de valores notoriamente inferiores ao preço corrente das mercadorias ou dos serviços;

IV - transporte ou estocagem de mercadorias desacompanhadas de documentos fiscais.

Parágrafo único. Para arbitrar o valor das operações ou prestações, nas hipóteses deste artigo, a autoridade fiscal levará em conta um dos seguintes critérios:

I - o preço constante de pautas elaboradas pela Secretaria de Estado da Receita;

II - o preço corrente da mercadoria ou sua similar na praça do contribuinte fiscalizado ou no local da autuação, ou o preço FOB à vista da mercadoria, calculado para qualquer operação;

III - o preço de custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido do percentual nunca inferior a 30% (trinta por cento), para qualquer tipo de atividade, nos termos do Regulamento;

IV - o preço nunca inferior ao custo dos produtos fabricados ou vendidos, conforme o caso, nos termos do Regulamento, em se tratando de saída de mercadorias de estabelecimentos industriais;

V - o que mais se aproximar dos critérios previstos nos incisos anteriores, quando a hipótese não se enquadrar, expressamente, em qualquer um deles.

 

Com efeito, da leitura dos dispositivos acima, extrai-se, sem maiores esforços hermenêuticos, que o arbitramento da base de cálculo do ICMS somente pode ser convalidado quando atendidas as condições dispostas nos artigos 18 e 23 da Lei nº 6.379/96.

Em apertada síntese, podemos inferir que se trata de medida excepcional, tendo espaço, tão somente, quando sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado.

Continuando a construção de sua tese, a recorrente afirma que “as irregularidades fiscais como suprimento irregular de caixa ou banco, passivo fictício ou inexistente, notas fiscais não lançadas, diferença a menor entre as declarações do contribuinte e as informações das operadoras de cartão de crédito e a diferença a maior entre os desembolsos e as receitas do contribuinte, constituem, nos termos do art. 23, II, da LICMS/PB, expressões de fundada suspeita de que os documentos e livros fiscais não refletem o valor real da operação ou da prestação, motivo pelo qual, deveria ter a autoridade fiscal, obrigatoriamente, realizado o arbitramento da base de cálculo das operações presumidas por um dos critérios previstos no parágrafo único, do mesmo art. 23.

Antes de tratarmos a respeito da base de cálculo para o caso em tela, faz-se necessário atentarmos para o fato que motivou a lavratura da peça acusatória em análise. Não podemos olvidar que, conforme já registrado alhures, o contribuinte está sendo denunciado por haver adquirido mercadorias consignadas em documentos fiscais com receitas provenientes de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis.

Pois bem. Não obstante a defesa afirmar que a autoridade fiscal deveria realizar o arbitramento da base de cálculo das operações presumidas com base nos critérios estabelecidos no parágrafo único do artigo 23 da Lei nº 6.379/96, entendemos que, no caso em apreço, tal recurso se mostra inaplicável.

Imperioso compreendermos que o arbitramento só se legitima quando os valores (ou os preços) sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado.

Dito isto, observemos que os valores que serviram de base de cálculo para a apuração do crédito tributário são exatamente os valores contábeis das notas fiscais de cuja falta de lançamento o contribuinte está sendo acusado.

E não poderia ser diferente, uma vez que o que se busca alcançar são os montantes das vendas omitidas que possibilitaram a aquisição das mercadorias acobertadas pelos documentos fiscais não escriturados pela empresa.

A respeito destes documentos, é incontroversa a validade jurídica que possuem, dado que se trata de notas fiscais eletrônicas emitidas por contribuintes do ICMS e autorizadas pelos Fiscos de seus respectivos domicílios.

Diante deste cenário, não caberia à fiscalização lançar mão de arbitramento, vez que ausentes as condições estabelecidas nos incisos do artigo 23 da Lei nº 6.379/96, pois, diferentemente do que afirma a autuada, a denúncia não se constitui expressão de fundada suspeita de que os documentos fiscais não refletem o valor real da operação, o que afasta, ipso facto, a possibilidade de arbitramento, nos termos do art. 23, II, da Lei nº 6.379/96.

Neste ponto, peço vênia para reproduzir um fragmento do Parecer nº 015/2019 – PGE (fls. 410 a 415) da lavrar do ilustre Procurador do Estado Francisco Glauberto Bezerra Júnior que, ao tratar sobre o tema, arrematou nos seguintes termos:

 

Observem que o referido artigo regulamenta que, sempre que o cálculo do tributo tenha por base o preço de mercadorias, bens e serviços, a autoridade arbitrará aquele valor SEMPRE QUE SEJAM OMISSOS OU NÃO MEREÇAM FÉ, OS DOCUMENTOS EXPEDIDOS pelo sujeito passivo ou PELO TERCEIRO LEGALMENTE OBRIGADO, com base nesse dispositivo, chagamos à conclusão de que não houve um arbitramento e sim uma presunção de omissão de receita com fundamento no art. 646 do RICMS-PB, e não houve o arbitramento pelo fato de que as NOTAS FISCAIS NÃO LANÇADAS são documentos idôneos e hábeis para fundamentar a autuação, não havendo, portanto, no meu entender, necessidade de arbitramento.”

 

Em razão da recente alteração na Lei nº 6.379/96 promovida pela Lei nº 11.615/19, entendemos recomendável fazermos algumas considerações, uma vez que uma leitura menos atenta poderia indicar que, somente após a inclusão dos §§ 5º a 10 no artigo 12 da Lei nº 6.379/96, estaria o Fisco autorizado a exigir o crédito tributário decorrente de falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios.

Vejamos o que dispõem os referidos dispositivos:

 

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

(...)

§ 5º Serão consideradas inexistentes as operações declaradas em documentos fiscais que não tenham sua materialidade comprovada.

§ 6º A declaração de inexistência das operações de que trata o § 5º deste artigo só ocorrerá após processo regular que confira ao contribuinte o devido direito de defesa, nos termos do Regulamento do ICMS.

§ 7º Na hipótese da declaração de inexistência das operações de que trata o § 6º deste artigo, os documentos fiscais objeto de tais operações serão considerados inidôneos para todos os efeitos fiscais e penais, os quais constituirão prova em favor do Fisco, salvo comprovação em contrário.

§ 8º Serão considerados inidôneos, neste Estado, os documentos fiscais emitidos em outras unidades da Federação quando estes tenham sido declarados inidôneos por tais unidades Federadas com fundamento na comprovação da inexistência material das operações declaradas nos referidos documentos.

§ 9º Presumem-se saídas as mercadorias e/ou prestados os serviços tributáveis, sem pagamento do ICMS devido, quando tais mercadorias e prestações tenham sido declaradas em documentos fiscais para os quais se tenha comprovada a inexistência material das referidas operações e/ou prestações, nos termos dos §§ 5º, 6º, 7º e 8º, deste artigo.

§ 10. O imposto a que se refere o § 9º deste artigo será calculado considerando como:

I - base de cálculo, o valor da operação ou da prestação declarada em cada documento fiscal, observados os arts. 18, 22, 23 e 24 desta Lei;

II - alíquota, aquela estabelecida nesta Lei;

III - data de saída das mercadorias ou da prestação dos serviços, a data de saída informada no documento fiscal de que trata o § 9º deste artigo, ou, na falta desta, a data de emissão do referido documento fiscal.

 

Depreende-se do normativo acima reproduzido que a situação a que se refere não guarda correspondência com o fato denunciado nos autos, pois diz respeito a operações declaradas em documentos fiscais que não tenham sua materialidade comprovada. No caso dos autos, não se contesta a validade dos documentos nem, tampouco, a realização das operações por eles acobertadas.

Mesmo correndo o risco de nos tornarmos redundantes, não é demais destacarmos que o procedimento fiscal, no que se refere à utilização dos valores dos documentos fiscais não registrados como receitas omitidas, não merece reparos.

O agente fazendário não poderia agir de maneira diversa, sob pena de contrariar expressas disposições legais às quais está vinculado.

O silogismo dialético da recorrente, caso prosperasse, traria, como consequência imediata, a impossibilidade prática de se autuar qualquer contribuinte, no âmbito da legislação do ICMS do Estado da Paraíba, com base nas presunções de que tratam os artigos 3º, §§ 8º e 9º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB, a exceção da Conta Mercadorias.

Não há como se extrair entendimento diverso daquele já consolidado em relação aos valores das vendas omitidas para efeito de aplicação das presunções relativas previstas no ordenamento jurídico do Estado da Paraíba. Da mesma forma que, no caso em exame, a receita omitida corresponde aos valores das notas fiscais não lançadas; no caso do Levantamento Financeiro, é a diferença positiva entre o somatório das despesas e o total das receitas no período; no caso do pagamento extra caixa, são os valores dos desembolsos não registrados no Caixa, etc.

A presunção, ou seja, a compreensão lógica que se extrai de um fato conhecido para provar a existência de outro desconhecido não se limita ao fato em si, alcançando outros elementos a ele intrinsicamente associados, a exemplo da falta de lançamento de notas fiscais e seus respectivos valores para formação da base de cálculo do fato presumido. Sendo assim, para o caso em comento, não poderia o auditor fiscal lançar mão de qualquer tipo de arbitramento, uma vez que a validade jurídica dos documentos fiscais não se está contestando.

Ao destacarmos a expressão “para formação da base de cálculo” no parágrafo anterior, buscamos chamar a atenção para um assunto sobre o qual já nos posicionamos em outras oportunidades e que merece atenção especial por parte desta Corte. Trata-se da inclusão do ICMS na base de cálculo do próprio imposto (gross up).

Para melhor compreensão, observemos as seguintes situações hipotéticas:

a)      Um contribuinte realiza venda de mercadorias acobertadas por nota fiscal no valor total de R$ 100,00 (cem reais); enquanto outro realiza operação idêntica, porém sem emissão de documentação fiscal;

b)      Os produtos são sujeitos à tributação normal, sobre a qual incide a alíquota de 18% (dezoito por cento).

 

No primeiro caso, o contribuinte destaca o ICMS no valor de R$ 18,00 (dezoito reais) e, considerando que o montante do imposto integra a base de cálculo, por força do comando insculpido no artigo 13, § 1º, I, da Lei Complementar nº 87/96[4].

Algumas notas fiscais apontadas pela defesa como registradas não foram identificadas na EFD do contribuinte, motivo pelo qual não as excluímos do levantamento fiscal.

Também não foram expurgadas as notas fiscais que a recorrente alega haverem sido lançadas na sua escrita contábil, em razão de os Livros Diário dos exercícios autuados terem sido autenticados na Junta Comercial do Estado da Paraíba em data posterior à da ação fiscal, a saber: 18 de maio de 2016, o que impede a aceitação destes livros como meio de prova, em observância ao que preceitua o artigo 643, § 7º, do RICMS/PB, verbis:

 

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

(...)

§ 7º A aceitação das escritas contábil e fiscal para a realização de auditoria e como prova processual junto aos órgãos julgadores administrativos, fica condicionada à apresentação dos livros Diário e Caixa, devidamente autenticados, no prazo estipulado pela fiscalização.

 

Por outro lado, observamos, na relação de notas fiscais, documentos que não deveriam ter sido incluídos, uma vez que não representam desembolsos financeiros e, por este motivo, não se prestam para embasar a denúncia. São os casos das notas fiscais: a) de simples remessa; b) que acobertaram outras saídas (com referência a notas fiscais de venda emitidas anteriormente); c) de entrada do emitente; e d) de devolução de compra, emitida por cliente da autuada.

Também foi deduzido o valor referente a R$ 499,80 (quatrocentos e noventa e nove reais e oitenta centavos) de ICMS associado ao mês de janeiro de 2014, pela ausência de elementos que possibilitem identificar, com precisão, o documento que lhe deu origem, vez que, na planilha fiscal, foi omitido o número da “chave de acesso” e, no campo “N. FISCAL”, consta a seguinte informação: “1,03E+08”.

Imperioso destacarmos que a pretensão da recorrente para que seja declarado nulo o Auto de Infração por equívocos no levantamento fiscal não merece acolhimento. Isto porque o crédito tributário, caso comprovadamente majorado indevidamente, pode (e deve) ser corrigido de forma a que represente a quantia efetivamente devida pelo contribuinte.

Por último, ressaltamos que, para validar a presunção de omissão de saídas, não se faz necessário que ocorra “estouro de Caixa”. Os dispositivos legais que autorizam a presunção não estabelecem esta condição. Assim, a existência de balanços superavitários não afasta a presunção.

Destarte, após minuciosa análise, concluímos pela necessidade de exclusão dos seguintes documentos fiscais:

 

 

 

 

PERÍODO

NOTA FISCAL Nº

DATA DE EMISSÃO

VALOR CONTÁBIL (R$)

ICMS A EXCLUIR (R$)

jan/13

18751

25/01/13

30.986,00

5.267,62

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

5.267,62

 

abr/13

12373

25/04/13

824,55

140,17

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

140,17

 

mai/13

9423

10/05/13

5.118,29

870,11

25485

18/05/13

1.379,46

234,51

25517

20/05/13

6.005,76

1.020,98

25613

21/05/13

6.005,76

1.020,98

25614

21/05/13

1.379,46

234,51

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

3.381,08

 

jun/13

10091

21/06/13

2.564,82

436,02

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

436,02

 

jul/13

27856

05/07/13

18.911,94

3.215,03

27927

08/07/13

18.911,94

3.215,03

10383

10/07/13

1.009,37

171,59

10387

10/07/13

972,67

165,35

103351

24/07/13

47.250,00

8.032,50

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

14.799,51

 

ago/13

104737

12/08/13

48.636,00

8.268,12

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

8.268,12

 

set/13

11221

04/09/13

571,43

97,14

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

97,14

 

out/13

27454

08/10/13

10.853,65

1.845,12

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

1.845,12

 

jan/14

 

17/01/14

2.940,00

499,80

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

499,80

 

fev/14

41871

06/02/14

469,99

79,90

14249

20/02/14

1.400,00

238,00

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

317,90

 

mar/14

44921

24/03/14

391,25

66,51

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

66,51

 

abr/14

5684

02/04/14

175,69

29,87

2881

09/04/14

58,56

9,96

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

39,82

 

jul/14

53187

30/07/14

153,29

26,06

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

26,06

 

out/14

95611

13/10/14

14.046,81

2.387,96

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

2.387,96

 

nov/14

5178

20/11/14

69,53

11,82

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

11,82

 

dez/14

6944

05/12/14

3.450,00

586,50

2163

15/12/14

430,00

73,10

21607

17/12/14

145,95

24,81

41759

17/12/14

222,50

37,83

99011

23/12/14

37.921,03

6.446,58

31104

27/12/14

428,76

72,89

24642

29/12/14

36.200,00

6.154,00

24643

29/12/14

36.200,00

6.154,00

1871

30/12/14

658,70

111,98

967

30/12/14

1.440,00

244,80

968

30/12/14

1.440,00

244,80

14518

30/12/14

619,15

105,26

24664

30/12/14

36.200,00

6.154,00

43767

31/12/14

15.428,95

2.622,92

43787

31/12/14

37.354,76

6.350,31

TOTAL DE ICMS A EXCLUIR (R$)

35.383,77

 

Sendo assim, restou procedente o seguinte crédito tributário:

 

 

 

AUTO DE INFRAÇÃO

VALOR CANCELADO

CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO

DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO

PERÍODO

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

CRÉDITO TRIBUTÁRIO (R$)

FALTA DE LANÇAMENTO DE N. FISCAL DE AQUISIÇÃO

jan/13

8.811,05

8.811,05

5.267,62

5.267,62

3.543,43

3.543,43

7.086,86

fev/13

23,65

23,65

0,00

0,00

23,65

23,65

47,30

mar/13

4.338,70

4.338,70

0,00

0,00

4.338,70

4.338,70

8.677,40

abr/13

56.411,13

56.411,13

140,17

140,17

56.270,96

56.270,96

112.541,92

mai/13

11.209,74

11.209,74

3.381,08

3.381,08

7.828,66

7.828,66

15.657,32

jun/13

1.020,31

1.020,31

436,02

436,02

584,29

584,29

1.168,58

jul/13

22.041,87

22.041,87

14.799,51

14.799,51

7.242,36

7.242,36

14.484,72

ago/13

22.738,07

22.738,07

8.268,12

8.268,12

14.469,95

14.469,95

28.939,90

set/13

316,40

316,40

97,14

97,14

219,26

219,26

438,52

out/13

2.173,22

2.173,22

1.845,12

1.845,12

328,10

328,10

656,20

nov/13

619,03

619,03

0,00

0,00

619,03

619,03

1.238,06

dez/13

99,96

99,96

0,00

0,00

99,96

99,96

199,92

jan/14

1.915,00

1.915,00

499,80

499,80

1.415,20

1.415,20

2.830,40

fev/14

5.787,98

5.787,98

317,90

317,90

5.470,08

5.470,08

10.940,16

mar/14

17.890,56

17.890,56

66,51

66,51

17.824,05

17.824,05

35.648,10

abr/14

2.605,62

2.605,62

39,82

39,82

2.565,80

2.565,80

5.131,60

mai/14

3.705,68

3.705,68

0,00

0,00

3.705,68

3.705,68

7.411,36

jun/14

268,94

268,94

0,00

0,00

268,94

268,94

537,88

jul/14

648,28

648,28

26,06

26,06

622,22

622,22

1.244,44

ago/14

8.136,34

8.136,34

0,00

0,00

8.136,34

8.136,34

16.272,68

set/14

2.905,61

2.905,61

0,00

0,00

2.905,61

2.905,61

5.811,22

out/14

25.245,94

25.245,94

2.387,96

2.387,96

22.857,98

22.857,98

45.715,96

nov/14

5.417,70

5.417,70

11,82

11,82

5.405,88

5.405,88

10.811,76

dez/14

68.991,40

68.991,40

35.383,77

35.383,77

33.607,63

33.607,63

67.215,26

TOTAIS (R$)

273.322,18

273.322,18

72.968,42

72.968,42

200.353,76

200.353,76

400.707,52

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a decisão monocrática e julgar parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000426/2016-76, lavrado em 14 de abril de 2016 contra a empresa TINTAS LUX LTDA EPP, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 440.707,52 (quatrocentos e quarenta mil, setecentos e sete reais e cinquenta e dois centavos), sendo R$ 200.353,76 (duzentos mil, trezentos e cinquenta e três reais e setenta e seis centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I; 160, I c/c 646, todos do RICMS/PB e R$ 200.353,76 (duzentos mil, trezentos e cinquenta e três reais e setenta e seis centavos) de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancelo, por indevido, o montante de R$ 145.936,84 (cento e quarenta e cinco mil, novecentos e trinta e seis reais e oitenta e quatro centavos), sendo R$ 72.968,42 (setenta e dois mil, novecentos e sessenta e oito reais e quarenta e dois centavos) de ICMS e R$ 72.968,42 (setenta e dois mil, novecentos e sessenta e oito reais e quarenta e dois centavos) de multa por infração.

Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.

 

Segunda Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 18 de fevereiro de 2020.

 

Sidney Watson Fagundes da Silva
Conselheiro Relator

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