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ACÓRDÃO Nº 000243/2020 PROCESSO Nº 1751212015-0

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

Processo nº 1751212015-0
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Recorrida: MARIA SULENE DANTAS SARMENTO
Preparadora: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR5 DA SEFAZ - SOUSA
Autuante: JAILDO GONÇALVES DOS SANTOS
Relator: CONS.º LEONARDO DO EGITO PESSOA

LEVANTAMENTO DA CONTA MERCADORIAS. LUCRO REAL. PREJUÍO BRUTO COM MERCADORIAS. CONTRIBUINTE QUE COMERCIALIZA PRODUTOS AMPARADOS POR ISENÇÃO E COM SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. VÍCIO MATERIAL CONFIGURADO. DECADÊNCIA DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE DO LANÇAMENTO MEDIANTE NOVO FEITO FISCAL. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

- Caracteriza-se material o vício que acomete o lançamento de ofício que pretende a cobrança de créditos tributários a pretexto da denúncia de utilização indevida de créditos fiscais, quando o levantamento é realizado com diversas inconsistências de dados. - No caso dos autos evidencia-se impossível a sua cobrança por meio de outro auto infracional, em face da decadência do direito de a Fazenda constituir o correspondente lançamento de ofício, situação que, por tornar inócua a nulidade do feito fiscal, atrai a sua improcedência.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

              A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para manter inalterada a decisão monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002436/2015-65, lavrado em 23 de dezembro de 2015 contra a empresa MARIA SULENE DANTAS SARMENTO, inscrição estadual nº 16.113.647-8, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.               Intimações necessárias, na forma regulamentar. 

                 P.R.I.

                      Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 24 de agosto de 2020.



                                                          LEONARDO DO EGITO PESSOA
                                                                   Conselheiro Relator

                                                         LEONILSON LINS DE LUCENA
                                                                           Presidente



Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, THAÍS GUIMARÃOES TEIXEIRA FONSECA, NAYLA COELI COSTA BRITO CARVALHO (Suplente), PETRÔNIO RODRIGUES LIMA.


                                                                SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA        
                                                                                Assessor Jurídico

Em análise nesta Corte, o recurso de ofício interposto contra decisão monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002436/2015-65, lavrado em 23 de dezembro de 2015 em desfavor da empresa MARIA SULENE DANTAS SARMENTO, inscrição estadual nº 16.113.647-8.

Na referida peça acusatória, consta a seguinte denúncia, ipsis litteris:

 

0063 – FALTA DE ESTORNO (PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS) >> Utilização indevida de créditos fiscais decorrentes de saídas de mercadorias tributáveis abaixo do valor de aquisição (prejuízo bruto com mercadorias), resultando na obrigação de recolhimento do imposto estadual.

Nota Explicativa: ICMS DEVIDO PELO ESTORNO DE CREDITOS DE ICMS DECORRENTE DE SAÍDAS ABAIXO DO CUSTO DE AQUISIÇÃO DETECTADO NA CONTA MERCADORIA.

 

Em decorrência deste fato, o representante , considerando haver o contribuinte infringido o artigo 85, III do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 113.495,58 (cento e treze mil, quatrocentos e noventa e cinco reais e cinqüenta e oito centavos), sendo de ICMS o valor de R$ 56.747,79 (cinquenta e seis mil, setecentos e quarenta e sete reais e setenta e nove centavos), com propositura de multa na importância de R$ 56.747,79 (cinquenta e seis mil, setecentos e quarenta e sete reais e setenta e nove centavos), arrimada no artigo 82, V, “h”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios às fls. 9 a 352.

Depois de cientificada por meio de aviso de recebimento (AR) em 6 de janeiro de 2016, a acusada interpôs petição reclamatória, às fls. 354 a 362, dos autos, alegando, em síntese, o que passo a apresentar:

* Que o levantamento conta mercadorias efetuado pela fiscalização apresenta equívocos no preenchimento do estoque inicial, nos valores de entrada de mercadorias, nos valores das notas fiscais não lançadas, nos valores das saídas de mercadorias e no estoque final, apresentando resultado diverso do real;

* Que a multa aplicada apresenta caráter confiscatório.

Em 29 de fevereiro de 2016 (fls. 437) houve manifestação do Auditor Jurídico da Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais para sanear o processo, solicitando ao autor do feito a realização da reconstituição da Conta Corrente do ICMS, com intuito de verificar a repercussão no recolhimento do ICMS.

Em cumprimento à solicitação supracitada, o autor do feito apresentou a reconstituição da conta corrente do ICMS do exercício de 2014 (fls. 440) e informou que “após a devidas compensações, uma diferença de ICMS, a ser recolhido, no valor de R$ 26.815,24, sem que haja crédito a ser transferido para o exercício posterior”.

 

Considerando os argumentos apresentados, a autuada requereu:

- A improcedência do Auto de Infração em tela;

 

Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 435), foram os autos conclusos (fls. 436) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, onde forem distribuídos ao julgador fiscal Paulo Eduardo de Figueiredo Chacon.

O julgador singular, após analisar o processo em tela, decidiu pela improcedência da denúncia, nos termos da seguinte ementa:

LEVANTAMENTO CONTA MERCADORIAS. LUCRO REAL. PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS. INFRAÇÃO NÃO CONFIGURADA

Levantamento realizado com diversas inconsistências de dados, impondo a improcedência do feito.

AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE.

 

Em observância ao que determina o artigo 80 da Lei nº 10.094/13, o julgador fiscal recorreu de sua decisão a esta instância ad quem.

A autuada tomou ciência da decisão singular por meio de DTE em 19 de julho de 2019 e não mais se manifestou nos autos.

Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.

Eis o relatório.

 

VOTO

 

Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002436/2015-65, a empresa MARIA SULENE DANTAS SARMENTO está sendo acusada de utilização indevida de créditos fiscais decorrentes de saídas de mercadorias tributáveis abaixo do valor de aquisição, detectada através do levantamento da Conta Mercadorias – Lucro Real no exercício de 2014.

 

- Acusação -

FALTA DE ESTORNO (PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS)

A denúncia toma como base o levantamento da Conta Mercadorias, no exercício de 2014, onde a fiscalização apurou saídas de mercadorias com tributação normal, abaixo do seu custo de aquisição, conforme demonstrativo (fls. 13). Posteriormente, após notificação da Assessoria Jurídica da GEJUP, o fiscal autuante refez o conta corrente do ICMS com a finalidade de verificar a repercussão, sendo reduzido o valor do ICMS devido de R$ 56.747, 79 para R$ 26.815,24.

Como é bem sabido por todos que labutam pela seara do direito tributário, o contribuinte optante pelo lucro real, e por, conseguinte, detentor de contabilidade regular, no caso de evidenciada a ocorrência de saídas de mercadorias com tributação normal abaixo do custo de aquisição (prejuízo bruto com mercadorias), ficam obrigados a efetuar o estorno dos créditos na proporção da redução verificada, como determina o art. 155, II, “a” e “b”, da CF, como se segue:

 

Art. 155 - ................................................................................

II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;

b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores.

 

 

 

Neste sentido, o Regulamento do ICMS no Estado da Paraíba - RICMS-PB reproduz o dispositivo constitucional, regulamentando-o nos termos do art. 85, III, conforme transcrito abaixo:

 “Art. 85. O sujeito passivo deverá efetuar estorno do imposto de que se tiver creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento, observado o disposto no § 6º:

(...)

III - for objeto de saída com base de cálculo inferior à operação de entrada, hipótese em que o valor do estorno será proporcional à redução;”(g.n.)

 

Ademais, a técnica aplicada faz parte de uma rotina clássica nos procedimentos de auditoria fiscal/contábil, constando, de forma sintética, a movimentação ocorrida no âmbito da empresa comercial, podendo evidenciar a regularidade ou não do cumprimento das obrigações tributárias, quando do rédito comercial com mercadorias tributáveis sujeitas ao ICMS em obediência aos parâmetros legais que delineiam o perfil da conta corrente do imposto estadual.

Pois bem, considerando o princípio da verdade material, que orienta o Processo Administrativo Tributário, impõe-se examinar a questão procedimental sob o prisma da legalidade.

Compulsando os elementos que instruem os autos, como bem relatou o julgador singular, no demonstrativo do levantamento da Conta Mercadorias, referente ao exercício de 2014, a Fiscalização considerou como se todo o estoque inicial de mercadorias no valor de R$ 368.169,36 fosse de tributação normal, incorrendo em grave erro, pois teria que ter segregado o que é tributação normal e o que é substituição tributária/isentos/outros, pois analisando o estoque apresentado pelo contribuinte verificamos diversos produtos sujeitos a substituição tributária (bebidas, leite em pó, hidratante, pilhas, fraldas, aparelho de barbear, entre outros).

Em relação ao estoque final, como bem observou o julgador singular, também merece reparo a informação contida no levantamento de que o mesmo é zero, pois em uma rápida análise na EFD apresentada pelo contribuinte na competência fev/15 verificamos um estoque total declarado referente a 31/12/2014 no valor de R$ 400.111,16.

Portanto, conforme declarações prestadas pelo contribuinte e constante do sistema ATF, os valores alocados pela Fiscalização incluíam mercadorias isentas e com Substituição Tributária, o que efetivamente eiva de vício o procedimento de apuração da falta, dada a circunstância de que, nessa situação, este não reflete a verdade dos fatos e, portanto, mostra-se incapaz de dar suporte à acusação de falta de estorno (prejuízo bruto com mercadoria), prevista no art. 85, III, do RICMS/PB.

 

                       

 

Também, conforme bem apontado pelo julgador monocrático, houve equívoco no preenchimento dos valores das entradas e saídas de mercadorias, apresentando, às fls. 371, planilha que indica a correta interpretação dos dados constantes no SPED do contribuinte, uma vez que considera de maneira adequada os CFOP’s e CST’s das operações.

Foi verificado também pela instância a quo, no que se refere às notas fiscais não lançadas o contribuinte admite o descumprimento de algumas obrigações, porém, demonstra que diversas notas fiscais se referem à anulação de operação por meio de devolução e, também, que não recebeu conjunto de mercadorias decorrentes de roubo, matéria, inclusive, já decidida pela instância julgadora1.

Portanto, considerando o elevado percentual de produtos sujeitos a substituição tributária nos estoques declarados, de notas fiscais que não eram de entradas e/ou que serviram para anulação da operação anterior, é de se concluir pela ineficácia do resultado da aplicação da técnica de fiscalização levantamento da Conta Mercadorias – Lucro real, dado ao desequilíbrio nos estoques, nas entradas e nas saídas, provocado pelas circunstâncias em referência, as quais se revelam capazes de infligir ao resultado do exame fiscal um distanciamento da verdade material, conferindo incerteza e iliquidez ao crédito tributário que o tenha como embasamento.

O erro verificado é procedimental, visto que se evidencia na técnica que lhe dá suporte que, em razão da distorção, contaminou a matéria que se pretendeu tributar e, por consequência, calculou um montante indevido do tributo.

 

 

1 Auto de infração nº 93300008.09.00002438/2015-54 – processo nº 1751232015-9

 

Na esteira da Lei Estadual nº 10.013/2013, que neste Estado regula o Processo Administrativo Tributável, tem-se a solução da questão:

“Art. 41. São requisitos do Auto de Infração e da Representação Fiscal:

(...)

V – a descrição da falta com o respectivo montante tributável:

VI – (...)

VII – o valor do tributo lançado de ofício”.

 

Diante do que, entendo que se caracterizou vício material, visto que atingiu a própria identificação da natureza da infração, e não somente a descrição do fato. Mesmo nessa circunstância, em princípio teria lugar a nulidade do auto de infração em tela, afinal, o lançamento de ofício não apresenta elementos suficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária. Aplicação da norma ínsita no inciso III do art. 14 da Lei Estadual nº 10.094/2013, que nos diz: uma vez que essa regra é aplicável às nulidades por vício formal, o que não é o caso dos autos, consoante os fundamentos acima expedidos.

“Art.14. São nulos:

III – os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalva, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados”. (Grifo não constante do original).

 

Todavia, tendo em vista que é de natureza material o vício que inquina o auto de infração em referência, e que a sua correção somente se faria mediante auto de infração específico, este teria que ser lavrado dentro do prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado. Todavia, no caso, essa providência não mais se faz possível, uma vez que, mesmo considerando a regra geral da decadência (art. 173, I do CTN), o direito de a Fazenda efetuar o correspondente lançamento de ofício já foi fulminado, haja vista que o fato gerador porventura eclodido diz respeito ao exercício de 2014, portanto há mais de cinco anos contados da sua possível ocorrência.

Com efeito, as nulidades decorrentes de vício material não atraem a aplicação do art. 173, II do CTN, uma vez que essa regra é aplicável às nulidades por vício formal, o que não é o caso dos autos, consoante os fundamentos acima expedidos.

Por fim, diante de tudo o acima exposado, entendo que se justifica a improcedência do feito fiscal, em virtude da iliquidez e incerteza na determinação do quantum debeatur, razão pela qual mantenho a decisão exarada pela instância monocrática.

 

Com estes fundamentos,

 

 

VOTO pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para manter inalterada a decisão monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002436/2015-65, lavrado em 23 de dezembro de 2015 contra a empresa MARIA SULENE DANTAS SARMENTO, inscrição estadual nº 16.113.647-8, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.

 

Intimações necessárias, na forma regulamentar.

 

 

Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência, em 24 de agosto de 2020.

 

 

                                                                                                                 Leonardo do Egito Pessoa
                                                                                                                      Conselheiro Relator

  

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