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ACÓRDÃO Nº.375/2019

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº0189032013-7
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
Recorrida:KAWAY INDUSTRIA E COMÉRCIO LTDA.
Repartição Preparadora:CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR3 DA SEFAZ
Autuante(s):CLOVIS CHAVES FILHO
Relator(a):MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES

FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. INFRAÇÃO CARACTERIZADA EM PARTE. OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTAS MERCADORIAS. CONTRIBUINTE OPTANTE PELO REGIME DE TRIBUTAÇÃO SIMPLES NACIONAL. TÉCNICA DE FISCALIZAÇÃO INADEQUADA. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. INFRAÇÃO CONFUGURADA. REDUÇÃO DA MULTA. ALTERADA QUANTO AOS VALORES A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO PARCIALMENTE PROVIDO.

Os valores lançados em Nota Fiscal sujeitam o contribuinte ao recolhimento do imposto correspondente.
As diferenças apuradas em Levantamento Financeiro denunciam omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção contida na legislação de regência.
No entanto, a técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
Aplicada a redução da multa em virtude de Lei mais benéfica.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial para alterar os valores da sentença monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000233/2013-72, lavrado em 5/3/2013, contra a empresa KAWAY INDUSTRIA E COMÉRCIO LTDA., inscrição estadual nº 16.161.055-26, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 18.146,42 (dezoito mil, cento e quarenta e seis reais e quarenta e dois centavos), sendo R$ 10.895,19 (dez mil, oitocentos e noventa e cinco reais e dezenove centavos) , de ICMS, nos termos do art. 106 e arts. 158, I e 160, I c/c art. 646, parágrafo único; todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 7.251,23 (sete mil, duzentos e cinquenta e um reais e vinte e três centavos), de multa por infração, nos termos dos artigos art. 82, II, “e” e V, “f”, da Lei nº 6.379/96, com as alterações dadas pela Lei nº 10.008/2013.                            Ao tempo em que mantenho cancelado o montante de R$ 24.159,94 (vinte e quatro mil, cento e cinquenta e nove reais e noventa e quatro centavos), e cancelo, pelas razões expostas, o crédito no valor de R$ 180,52 (cento e oitenta reais e cinquenta e dois centavos) discriminados em R$ 8.522,05 (oito mil, quinhentos e vinte e dois reais e cinco centavos) de ICMS e R$ 15.818,41 (quinze mil, oitocentos e dezoito reais e quarenta e um centavos) de multa por infração.

 P.R.I.


Segunda Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 12 de julho de 2019.



                                                               MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES 
                                                                                     Conselheira Relatora



                                                                   GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE 
                                                                                              Presidente



Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara de Julgamento, DAYSE ANNYEDJA GONÇALVES CHAVES, PETRONIO RODRIGUES LIMA e SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA.




                                                                 FRANCISO GLAUBERTO BEZERRA JÚNIOR
                                                                                     Assessor Jurídico

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            RELATÓRIO

 

No Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000233/2013-72, lavrado em 5/3/2013, contra a empresa KAWAY INDUSTRIA E COMÉRCIO LTDA., inscrição estadual nº 16.161.055-2, relativamente a fatos geradores ocorridos entre 14/05/2009 a 30/11/2012, constam as seguintes denúncias:

 

- FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte optante do Simples Nacional deixou de recolher o ICMS.

 

Nota Explicativa:

O CONTRIBUINTE EMITIU DOCUMENTO FISCAL, SÉRIE D, NUMERAÇÂO DE 2363 3750 E NÃO RECOLHEU O ICMS CORRESPONDENTE.

 

- OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO >> O contribuinte optante do Simples Nacional omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto, tendo em vista a constatação de que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas.

 

Nota Explicativa:

VALOR DETECTADO EM PROCEDIMENTO DE LEVANTAMENTO FINANCEIRO.

 

- OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte optante do Simples Nacional omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através de levantamento da Conta Mercadorias.

 

Nota Explicativa:

VALOR DETECTADO ATRAVÉS DE PROCEDIMENTO EFETIVADO NA CONTA.

 

Foram dados como infringidos: o art. 106 e arts. 158, I e 160, I c/c art. 646, parágrafo único; todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, além dos arts. 9º e 10º da Res. CGSN nº 030/2008 e/ou arts 82 e 84 da Res. CGSN nº 094/2011, com proposição das penalidades previstas no art. 82, II, “e” e V, “f”, da Lei nº 6.379/96 e art. 16, II da Res. CGSN nº 030/2008 e/ou art. 87, II da Res. CGSN nº 094/2011, sendo apurado um crédito tributário de R$ 42.486,88 (quarenta e dois mil, quatrocentos e oitenta e seis reais e oitenta e oito centavos), composto de R$ 19.417,24 (dezenove mil, quatrocentos e dezessete reais e vinte e quatro centavos), de ICMS, e R$ 23.069,64 (vinte e três mil, sessenta e nove reais e sessenta e quatro centavos), de multa por infração.

 

                        Cientificada, da ação fiscal, por via postal, em 13/3/2013 AR (fl. 04), a autuada apresentou reclamação, em 8/4/2013 (fls. 54-57), na qual alega os seguintes pontos:

 

a)      É optante do Simples Nacional e que recolhe mensalmente os tributos, mediante documento único de arrecadação e que fez a declaração de todo o faturamento nas DASN, logo, em seu entendimento, estaria sendo punida indevidamente quanto a acusação de falta de recolhimento do ICMS, caracterizando “bis in idem”;

b)      Quanto ao Levantamento Financeiro, exercício 2011, discorda dos valores apurados, pois o fiscal não teria levado em consideração os valores de duplicatas a pagar e que o mesmo teria procedido ao arbitramento de despesas como também o mesmo teria falhado a não considerar o Livro Caixa em sua auditoria;

c)      Quanto à acusação de Omissão de Saídas – Conta Mercadorias, exercício de 2009, o procedimento é inadequado e impróprio, por tratar-se de empresa industrial do ramo de confecções de peças de vestuário.

Por fim, entendendo que as autuações estão eivadas de vícios, requer a Improcedência do Auto de Infração em epígrafe.

 

Por sua vez, o fazendário opôs contestação, conforme (fls. 62-64), onde defende que as alegações da reclamante não devem prosperar, haja vista os dados constantes na planilha demonstrativa de operações pertinentes ao CFOP (fl. 61) não haver o registro de mercadorias destinadas ao processo industrial, fato este também observado na DASN (f.11).

             

Sem informação de antecedentes fiscais, os autos foram conclusos (fl. 67), e enviados para a Gerência de Julgamentos de Processos Fiscais – GEJUP, onde o auditor jurídico do órgão fez baixar os autos em diligência para que fossem anexados os procedimentos fiscais – Levantamento Financeiro de 2009 e a Conta Mercadorias de 2011 (fl. 68).

 

Cumprida a medida saneadora, o processo retornou à GEJUP, onde foi distribuído para a julgadora fiscal, Rosely Tavares de Arruda, que decidiu pela parcial procedência do feito fiscal, fixando o crédito tributário em R$ 18.326,94 (dezoito mil, trezentos e vinte e seis reais e noventa e quatro centavos), sendo R$ 10.985,45 (dez mil, novecentos e oitenta e cinco reais e quarenta e cinco centavos), de ICMS, e R$ 7.341,49 (sete mil, trezentos e quarenta e um reais e quarenta e nove centavos), de multa por infração, tendo recorrido hierarquicamente, nos termos do art. 80 da Lei nº 10.094/2013 (fls.105-117).

 

Cientificada da decisão de primeira instância, por via postal, em 11/7/2016 - AR (fl. 120), a recorrente apresentou recurso voluntário em 12/8/2016 (fls. 121-126), tendo sido considerado revel pela Repartição Fiscal (fl. 129).

 

 Cientificada da condição de revel, por via postal, em 22/8/2016 AR (fl. 130), a autuada protocolou recurso de agravo perante o Conselho de Recursos Fiscais (fls. 131-143), sendo denegada a pretensão, conforme Acórdão nº 370/2016 (fls. 149-150).

 

Notificado o contribuinte da decisão, os autos retornaram a esta Relatoria, onde passo a proceder sua análise e julgamento do recurso hierárquico.

 

Este é o relatório.

 

VOTO

                                   

Em exame o recurso hierárquico, interposto contra a decisão de primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000233/2013-72, lavrado em 5/3/2013, contra a empresa em epígrafe, com crédito tributário anteriormente relatado.

                                   

Cabe de início considerar que o lançamento fiscal se procedeu em conformidade com o art. 142 do CTN, e com aos requisitos da legislação, não se incluindo em nenhum dos casos de nulidade, elencados nos arts. 14, 16 e 17, da Lei nº 10.094/2013 (Lei do PAT).

                                   

 

Falta de Recolhimento do ICMS

 

Nesta denúncia, a fiscalização verificou que o contribuinte não levou à tributação as operações de vendas de mercadorias a consumidor final, conforme demonstrativo e documentos (fls. 38-49), incorrendo na falta de recolhimento do imposto, nos termos do art. 106, VIII, do RICMS/PB, abaixo transcrito:

 

Art. 106. O recolhimento do imposto de responsabilidade direta do contribuinte far-se-á:

 

(...)

 

VIII – nos demais casos, no momento em que surgir a obrigação tributária.

                                               

Neste sentido, a falta de recolhimento do imposto fica evidenciada pela omissão das operações de vendas de mercadorias, que faz desinflar o faturamento da empresa base de tributação do Simples Nacional.

                                   

Em primeira instância, a julgadora singular comparou os valores de faturamento declarados pelo contribuinte, nos extratos do Simples Nacional, com aqueles levantados pela fiscalização, em cada período, considerando como subsistentes as diferenças onde as parcelas omitidas fossem maiores que os valores declarados nos extratos do Simples Nacional.

  

Portanto, foi comprovada parcialmente a acusação, visto que nos meses de fevereiro e julho de 2012, os valores de faturamento encontravam-se menores do que os valores de receita omitidas denunciada no Auto de Infração em tela, conforme dito acima. Assim, o diligente julgador primevo realizou ajuste no crédito tributário, com o devido abatimento dos valores cancelados.

 

Observa-se que no presente caso o sujeito passivo trouxe à baila provas documentais em seu favor, que serviram de alicerce para a análise e decisão da instância a quo, também objeto do recurso hierárquico ora em questão.

 

Registre-se que o diligente julgador de 1ª instância acolheu as alterações advindas da Lei 10.008/13, promovendo redução das penalidades previstas no art. 82, II, “e” e V, “a” e “f”, adotando o Princípio da Retroatividade da Lei mais benigna disciplinada no art. 106¹, II, alínea “c” do CTN.

Portanto, sem outros argumentos a analisar, venho a ratificar a decisão da instância singular que se procedeu nos termos da legislação tributária.

 

Levantamento Financeiro

 

            A acusação trata de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, apurada, no exercício de 2011, através de Levantamento Financeiro, conforme demonstrativo (fls. 36-37).

           

            O procedimento encontra respaldo na nossa legislação, e se consubstancia pelo confronto de todas as receitas da empresa com as despesas operacionais, não operacionais e as disponibilidades em caixa e em bancos, partindo do princípio de que as receitas da empresa devem ser suficientes para satisfazer todos os dispêndios do estabelecimento, assim considerados não apenas a aquisição de mercadorias para a revenda, mas, também, às despesas com pessoal, água, energia, pro labore, materiais de uso e consumo, aluguéis, e outras.

 

            O método é largamente utilizado e aceito como meio de aferição fiscal, estando disciplinado no artigo 643 do RICMS/PB, sendo que as diferenças verificadas denunciam irregularidade por omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção estabelecida no artigo 646 do RICMS, conforme dispositivos transcritos abaixo:

 

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

 

                (...)

§3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não esteja obrigado ao regime de tributação com base no lucro real e tenha optado por outro sistema de apuração de lucro, nos termos da legislação do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, será exigido livro Caixa, com escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês

 

§4º Na hipótese do parágrafo anterior, como mecanismo de aferição no confronto fiscal, será obrigatório:

 

I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, onde deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas operacionais ou não operacionais, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e o no final do período fiscalizado;

             

§ 5º Na ausência da escrituração do livro Caixa, que trata o § 3º, para que se possa levar a efeito o demonstrativo financeiro referido no parágrafo anterior, os saldos no início e no final do exercício serão considerados inexistentes. 

                             

§ 6º As  diferenças  verificadas  em  razão  do  confronto  fiscal  denunciam  irregularidade, observado o disposto no art. 646.

 

 Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias  não  contabilizadas  ou  de  declarações  de  vendas  pelo  contribuinte  em  valores inferiores  às  informações  fornecidas  por  instituições  financeiras  e  administradoras  de  cartões  de  crédito, autorizam  a  presunção  de  omissão  de  saídas  de  mercadorias  tributáveis  sem  pagamento  do  imposto,  ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção (Decreto nº 28.259/07). 

                            

 Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se igualmente a qualquer situação em  que a  soma das  despesas,  pagamentos de  títulos,  salários,  retiradas,  pró-labore,  serviços  de terceiros,  aquisição  de  bens  em  geral  e  outras  aplicações  do  contribuinte  seja  superior  à  receita  do estabelecimento.             

                       

Como se observa, a denúncia encontra respaldo em nossa legislação, sendo matéria bastante conhecida deste Colegiado, onde a ocorrência da infração se verifica por presunção legal, juris tantum.

 

                                    Assim, sendo constatado que as receitas auferidas não foram suficientes para fazer frente às despesas do estabelecimento, no exercício considerado, aplica-se a presunção de que diferença apresentada é decorrente de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto, restando ao sujeito passivo o direito de provar a improcedência da acusação com documentos que atestem a não ocorrência do fato gerador presumido.

 

Neste quesito, é sabido que há o deslocamento para o regime geral de tributação, regido pelo RICMS/PB, nos casos em que o contribuinte optante do Simples Nacional incorre em omissão de saídas de mercadorias tributáveis, ou quaisquer das condutas enumeradas no inciso XIII do §1º do artigo 13 da LC nº 123/2006.

 

A empresa discorda dos valores apurados, alegando que o fiscal não teria levado em consideração os valores de duplicatas a pagar e que o mesmo teria procedido ao arbitramento de despesas como também o mesmo teria falhado ao não considerar o Livro Caixa em sua auditoria.

 

Contudo, não prospera tais argumentos face ao fato da empresa não ter trazido provas que pudessem confirmar a existência de duplicatas e de valores escriturados em Livro Caixa.

 

Por sua vez, em contestação, o Agente Fazendário informa que o resultado do procedimento fiscal teve como base as informações prestadas pelo próprio contribuinte, como na DASN, GIM, e despesas administrativas apresentadas.

 

Assim, não tendo a autuada apresentado provas de valores divergentes daqueles apurados no Levantamento Financeiro, e estando esse procedimento fiscal respaldado pelo arcabouço probatório anexado aos autos pela fiscalização, a julgadora de 1ª grau manteve a acusação, diante da falta de apresentação de provas pela reclamante que dessem suporte às suas alegações.

 

Conta Mercadorias

 

            A acusação trata de diferença tributável apurada em Levantamento da Conta Mercadorias, no exercício de 2009, onde foi apurado que o contribuinte não alcançou a margem de lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas – CMV, conforme demonstrativo (fl. 35).

 

            Como se sabe, o Levantamento da Conta Mercadorias é um procedimento largamente utilizado e aceito nos órgãos julgadores administrativos,  tornando-se obrigatório, como meio de aferição fiscal, nos termos da legislação em vigor, para os contribuintes que, por não apresentarem escrita contábil regular, ficaram impossibilitados de apurar o lucro real, nos referidos exercícios, ficando então sujeitos a guardar uma margem de vendas, num percentual de 30%, sobre os valores obtidos para o CMV, conforme disciplina o art. 643 do RICMS/PB, verbis:

 

 Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

 

                (...)

 

§3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não esteja obrigado ao regime de tributação com base no lucro real e tenha optado por outro sistema de apuração de lucro, nos termos da legislação do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, será exigido livro Caixa, com escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês

 

§4º Na hipótese do parágrafo anterior, como mecanismo de aferição no confronto fiscal, será obrigatório:

 

I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, onde deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas operacionais ou não operacionais, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e o no final do período fiscalizado;

 

II – o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, devendo tal acréscimo satisfazer as despesas arroladas no Demonstrativo Financeiro de que trata o inciso anterior, deste parágrafo, sendo, ainda, vedada a exclusão do ICMS dos estoques, compra e vendas realizadas, prevalecendo tal exclusão apenas para aqueles que mantenham escrita contábil regular. (g.n.).

 

            Assim, os contribuintes optantes pelo lucro presumido, que não apresentarem contabilidade regular, estarão sujeitos, pela legislação, ao arbitramento de uma margem de lucro bruto de 30% (trinta por cento), sobre o custo das mercadorias adquiridas.

 

            No caso dos autos, ficou constatado que as vendas realizadas não ultrapassaram a margem de 30% (trinta por cento) sobre o CMV, inferindo-se que o contribuinte omitiu receitas pretéritas, denotando vendas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, como prevê o art. 646, parágrafo único, do RICMS/PB, abaixo reproduzido:

 

Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

 

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, assim como a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados ou Vendidos, conforme o caso.

 

Dessa forma, ficou o contribuinte sujeito ao pagamento do imposto por contrariar os artigos 158, I e 160, I, do RICMS/PB, abaixo transcritos:

 

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

 

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

 

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

 

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

 

Inicialmente, repiso que a acusação descrita no Auto de Infração (Conta Mercadorias) teve, como fato motivador, a identificação de omissões de saídas de mercadorias tributáveis, detectadas pela fiscalização nos meses de maio a dezembro de 2009.

 

Não podemos perder de vista que a LC nº 123/06, em seu artigo 34, não deixa dúvidas acerca da aplicação das presunções de omissão de receitas para contribuintes do Simples Nacional.

 

Art. 34.  Aplicam-se à microempresa e à empresa de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional todas as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples
Nacional.

 

Pois bem. Resta evidente que a própria Lei Complementar nº 123/06, em seu artigo 13, § 1º, “f”, ofereceu solução clara para a questão, ao determinar que, nas operações ou prestações desacobertadas de documento fiscal (omissão de receitas), seja aplicada a legislação tributária atribuída às demais pessoas jurídicas. A clareza do texto normativo não exige do hermeneuta maiores esforços interpretativos. Senão vejamos:

 

Art. 13.  O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

(...)

§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

(...)

XIII - ICMS devido:

(...)

f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal; (g. n.)

 

O comando insculpido no dispositivo acima transcrito não deixa dúvidas quanto à necessidade de deslocamento da sistemática de apuração do ICMS para o regime geral quando o contribuinte, enquadrado como Simples Nacional, realiza quaisquer das condutas descritas no inciso XIII do § 1º do artigo 13, da Lei Complementar nº 123/2006.

 

É exatamente esta a regra adotada quando, por exemplo, o Simples Nacional atua como substituto tributário ou quando realiza uma operação de importação. Em todos estes casos (incluindo a conduta descrita no Auto de Infração), deve-se observar a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas.

 

Ressalte-se que não estamos diante de um conflito aparente de normas, muito menos de aplicação de lei mais gravosa ao contribuinte. É o próprio princípio da especialidade (observância à LC nº 123/06) que impõe aos destinatários da norma a obrigatoriedade de observar as regras gerais, sempre que o contribuinte realizar uma conduta que se amolde perfeitamente às situações descritas no artigo 13, § 1º, XIII, da LC nº 123/06 (fenômeno da subsunção).

 

Para demonstrar a perenidade deste entendimento na instância ad quem, reproduzo abaixo o recentíssimo Acórdão nº 91/2019, do ilustre Conselheiro Petrônio Rodrigues Lima:

 

OMISSÃO DE RECEITAS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. INFRAÇÃO CARACTERIZADA EM PARTE. SIMPLES NACIONAL. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL ÀS DEMAIS PESSOAS JURÍDICAS. MULTA RECIDIVA. INAPLICÁVEL. REINCIDÊNCIA NÃO CONFIGURADA. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSOS HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO DESPROVIDOS.

 

- Diferença apurada em Levantamento Financeiro enseja a ocorrência de omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção relativa contida na legislação de regência. 

 

- Excluída parte do imposto apurado no Levantamento Financeiro, em razão da ocorrência de prejuízo bruto com mercadorias com substituição tributária, isentas e não tributadas, verificada na Conta Mercadorias, bem como a exclusão de valor referente a notas fiscais não lançadas, que não tinham identificação ou provas documentais de suas existências.

 

- Na acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, em relação a contribuintes optantes pelo regime de recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.

 

- Afastamento da multa recidiva, ante a ausência dos requisitos legais para a sua aplicação.

 

Não obstante o fato de restar demonstrada a possibilidade de se exigir, de contribuinte enquadrado como Simples Nacional, ICMS em razão de omissão de receitas, vislumbro, no caso do Levantamento da Conta Mercadorias, uma questão de essencial relevância que prejudicou o lançamento em sua integralidade, a saber: a técnica aplicada.

 

Em diversos momentos, o Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba se posicionou pela admissibilidade da Conta Mercadorias como técnica de fiscalização válida para fundamentar a denúncia de omissão de receitas. É fato.

 

O aprofundamento das discussões nesta Casa, aliado ao aprimoramento e ao melhor embasamento das defesas administrativas, minaram a certeza anteriormente existente e exigiram uma mudança de entendimento quanto à matéria, ao menos por parte desta relatoria.

Imperativo salientarmos mais uma vez que o que se está a discutir não é a omissão em si, mas a técnica da Conta Mercadorias para contribuinte do Simples Nacional, pelo fato de a LC nº 123/06 se mostrar incompatível com o procedimento realizado pela auditoria.

 

Em tempo: para os demais contribuintes, a técnica revela-se plenamente eficaz, apropriada e dotada de validade jurídica para embasar a acusação. O alcance deste entendimento é, portanto, hermético, não autorizando ampliações para situações outras.

 

Noutras palavras, o que se está a buscar é a compatibilização da legislação estadual com a Lei Complementar nº 123/06.

Assim como recorremos à lei especial para justificar a possibilidade de aplicação da legislação afeta às demais pessoas jurídicas para os casos de omissão de receitas, também o fazemos para sustentar a imprestabilidade da técnica utilizada (Conta Mercadorias) para dar arrimo à acusação em comento.

 

É cediço que a LC nº 123/06 instituiu tratamento diferenciado para os contribuintes que se amoldarem às condições nela estabelecidas e fizerem opção por este regime diferenciado. Neste norte, a partir da inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional, o regramento especial passa a produzir efeitos para o sujeito passivo, assim como para o Fisco. Não se quer dizer com isso que os demais normativos não lhe sejam aplicáveis. O que se afirma é que se deve observar se a norma se harmoniza com a LC nº 123/06.

 

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

 

Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.

 

Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:

 

(...)

 

X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;

 

Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.     

 

Diante de todo o exposto, resta-me improceder a denúncia de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, apurada por meio do Levantamento da Conta Mercadorias.

           

No tocante à penalidade, os contribuintes do Simples Nacional, também, estão sujeitos à legislação aplicável aos contribuintes enquadrados no regime normal, quando praticarem operações ou prestações desacobertadas de Nota Fiscal.

 

Assim, a julgadora singular, corretamente, procedeu à correção das penalidades aplicadas nos termos previstos no art. 82, II, “e” e V, “f”, da Lei n° 6.379/96, verbis:

 

Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:

(...)

II - de 50% (cinquenta por cento):

(...)

e) aos que deixarem de recolher o imposto no todo ou em parte, nas demais hipóteses não contidas neste artigo;

(...)

V – de 100% (cem por cento):

(...)

f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;             

 

 

 

Diante do exposto, com os ajustes necessários e correção dos percentuais para as multas aplicadas, o crédito tributário passa a apresentar a seguintes composição:

 

 

 

 

 

 

 

 

AUTO DE INFRAÇÃO

VALOR CANCELADO

CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO

DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO

PERÍODO

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

VALOR DEVIDO (R$)

FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS

jan/12

617,78

617,78

585,99

601,88

31,79

15,90

47,69

fev/12

1.433,97

1.433,97

1.433,97

1.433,97

0,00

0,00

0,00

mar/12

3.429,44

3.429,44

2.394,60

2.912,02

1.034,84

517,42

1.552,26

abr/12

1.597,57

1.597,57

1.420,64

1.509,11

176,93

88,46

265,39

mai/12

1.394,04

1.394,04

1.384,90

1.266,27

255,55

127,77

383,32

jun/12

655,90

655,90

511,49

583,70

144,41

72,20

216,61

jul/12

976,61

976,61

976,61

976,61

0,00

0,00

0,00

ago/12

2.436,83

2.436,83

0,00

1.218,42

2.436,83

1.218,42

3.655,25

set/12

1.458,94

1.458,94

0,00

729,47

1.458,94

729,47

2.188,41

out/12

974,08

974,08

0,00

487,04

974,08

487,04

1.461,12

nov/12

774,55

774,55

0,00

387,28

774,55

387,28

1.161,83

OMISSÃO DE   SAÍDAS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO

2011

3.607,27

7.214,54

0,00

3.607,27

3.607,27

3.607,27

7.214,54

OMISSÃO DE   SAÍDAS – CONTA MERCADORIAS

2009

90,26

135,39

90,26

90,26

0,00

0,00

0,00

TOTAL

 

18.146,42

 

 

Com esses fundamentos,

 

 

VOTO pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial para alterar os valores da sentença monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000233/2013-72, lavrado em 5/3/2013, contra a empresa KAWAY INDUSTRIA E COMÉRCIO LTDA., inscrição estadual nº 16.161.055-26, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 18.146,42 (dezoito mil, cento e quarenta e seis reais e quarenta e dois centavos), sendo R$ 10.895,19 (dez mil, oitocentos e noventa e cinco reais e dezenove centavos) , de ICMS, nos termos do art. 106 e arts. 158, I e 160, I c/c art. 646, parágrafo único; todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 7.251,23 (sete mil, duzentos e cinquenta e um reais e vinte e três centavos), de multa por infração, nos termos dos artigos art. 82, II, “e” e V, “f”, da Lei nº 6.379/96, com as alterações dadas pela Lei nº 10.008/2013.

Ao tempo em que mantenho cancelado o montante de R$ 24.159,94 (vinte e quatro mil, cento e cinquenta e nove reais e noventa e quatro centavos), e cancelo, pelas razões expostas, o crédito no valor de R$ 180,52 (cento e oitenta reais e cinquenta e dois centavos) discriminados em R$ 8.522,05 (oito mil, quinhentos e vinte e dois reais e cinco centavos) de ICMS e R$ 15.818,41 (quinze mil, oitocentos e dezoito reais e quarenta e um centavos) de multa por infração.

 

 

Segunda Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Presidente Gildemar Macedo, em 12 de julho de 2019.

 

MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
Conselheira Relatora

 

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